E não vem a caso reiterar que a maioria do capital da Embraer não se encontra na mão de brasileiros, contra o que não há oposição deste Juízo, ou seja,
sob o aspecto exclusivamente acionário e os interesses financeiros correspondentes, reconhece-se não haver qualquer debate no bojo desta ação.
O que nela se discute é se direitos correspondentes à “golden share” da União, isto é, no que incide de concreto na Embraer aquela ação, que é na sua
totalidade, estarão ou não sendo alterados aqueles direitos e afirmá-los que não, apenas consiste em uma meia verdade, pois apenas serão preservados no que
remanescer da Embraer e não sobre a Embraer atual.
Visualizar na conservação da “Golden Share” da União apenas no que remanescer após a segregação, que seu direito estaria preservado com base em
inteligente jogo de palavras afirmando que os direitos da “golden share” permaneceriam hígidos (porque como "direitos" assim o estariam, mesmo que sobre
uma parte mínima e deficitária) é inaceitável visto não traduzir a realidade material efetiva.
Sobre o ponto seguinte: "o Conselho de Defesa Nacional é um colegiado composto por Ministros de Estado, e pelos Comandantes das Forças Armadas,
cujas opiniões têm por sua própria natureza a conotação político-institucional, no sentido mais elevado do conceito de política, razão pela qual sua convocação é
reservada constitucionalmente a determinados assuntos, bem delineados nos incisos do art. 91, § 1º, da Constituição Federal, e mais amiúde detalhados nos arts. 1º e 5º, da Lei nº
8.183/91. Nestes termos, ressalta a União que trazer para este âmbito de deliberação estratégica a avaliação de uma complexa operação de Direito Societário, permeada por detalhes técnicos
envolvendo as legislações de dois países diferentes, e das respectivas normas corporativas de ambas as companhias, pode culminar em resultado com repercussões prejudiciais a todos os envolvidos, e que
poderão ser usados em desfavor da própria acionista União" cabíveis algumas observações.
Oportuno observar que, historicamente, uma das primeiras questões na qual o Conselho de Segurança Nacional se manifestou foi sobre a implantação da
indústria siderúrgica do Brasil pois desde meados de 1930 essa questão não vinha sendo considerada como simples problema político-econômico de cuja solução,
dependia o futuro da defesa nacional. Portanto, ao menos historicamente se pode afirmar ter havido precedente do Conselho de Segurança Nacional manifestarse sobre interesses estratégicos que podem, indiretamente, apresentar repercussão no âmbito da segurança nacional.
A Constituição Federal ao prever a existência não mais do Conselho de Segurança Nacional, mas o Conselho de Defesa Nacional, contém em seu artigo
91, a seguinte redação:
Art. 91 O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do estado democrático...
...
Compete ao Conselho de Defesa Nacional:
IV - estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a independência nacional e a defesa do estado democrático.
O artigo 1º da Lei nº 8.183/91, contém a seguinte redação:
Art. 1º O Conselho de Defesa Nacional (CDN), órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa dos estado democrático, tem sua organização e funcionamento
disciplinados nesta lei.
...
Parágrafo único. Na forma do parágrafo 1º do art. 91 da Constituição, compete ao Conselho de Defesa Nacional:
d) estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a independência nacional e a defesa do estado democrático.
...
Art. 5º O exercício da competência do Conselho de Defesa Nacional serão fundamentadas no estudo e no acompanhamento dos estudos de interesse da independência nacional e da defesa do estado democrático, em especial o
que se refere:
I - à segurança da fronteira terrestre, do mar territorial, do espaço aéreo e de outras áreas indispensáveis à defesa do território nacional
II - quanto à ocupação e à integração da faixa de fronteira;
III - quanto à exploração dos recursos naturais de qualquer tipo e ao controle doe materiais de atividades consideradas do interesse da defesa nacionais.
Relembrando que, historicamente, o Conselho de Segurança Nacional teve a oportunidade de se manifestar sobre questão que apenas indiretamente
disseram respeito ao seu nome, se pelo conteúdo expresso na norma constitucional não se pode afirmar que o desmembramento (segregação) da Embraer para
transferência para a New Co, na qual, para a Embraer, não restaria qualquer parcela de administração e a participação em seu Conselho se faria em condição de
"observadora sem direito à veto", exceto no que se refere à distribuição de dividendos no que superassem 50% de reservas sobre o lucro, poderia representar um efetivo risco à segurança
nacional, por outro, o próprio texto constitucional admite esta participação quando a questão envolve a soberania nacional e defesa do estado democrático e, no caso,
parece certo que interpretadas as expressões constantes do texto constitucional e aqui ressaltadas em negrito, não se pode afirmar que haveria uma total
ausência de legitimidade desta atuação.
Soberania nacional e defesa do estado democrático são conceitos que tanto permitem a inclusão quanto que deles se exclua muitos eventos, seja por
considerá-los afetando-o, como não.
Porém, uma ação de classe especial (“golden share”) em poder da União proveniente de uma empresa que, em processo de privatização, primeiro previu
que aquela existiria (por si só um sinal evidente de consistir empresa estratégica) representa, sem dúvida séria, um elemento tradutor de soberania, cujo alcance vai muito
além dos interesses de um simples acionista, como se intenta transformá-lo, ao se atribuir competência desta análise apenas a órgãos de "direito societário".
Exatamente por ser considerada uma empresa estratégica e por caber ao CDN estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias a garantir a
independência nacional na expressão da lei, não se pode afirmar que o referido conselho estaria extrapolando suas atribuições na medida que, mais do que razoável
considerar como estratégica a preservação de permanente evolução e da independência tecnológica do Brasil na aviação, onde tem dado provas de extremo
talento e competência e mais ainda porque indissociável da parte militar da mesma empresa.
É certo não consistir uma competência especial entre as previstas no artigo 5º no sentido do controle dos materiais de atividades consideradas do interesse da defesa
nacionais, porém, tampouco se pode considerar que a lei teria limitado a competência constitucional do referido conselho considerando que materiais das
atividades da Embraer somente seriam de interesse militar se contivessem, a exemplo dos Airbags de automóveis, certa quantidade de explosivo. Enfim, da
tecnologia aeronáutica ser de exclusivo interesse militar apenas em aeronaves dotadas de armamento fornecidas para as três armas e não da tecnologia em si.
I mpossível considerar a Embraer como equivalente a uma fábrica de cerveja ou de cosméticos e ignorar o que revela a história de que nas duas grandes
guerras mundiais foram as indústrias civis as responsáveis pela construção de veículos militares.
“Golden Share”, como ação de classe especial prevista em processos de privatização, representa um patrimônio público de titularidade do país,
concedendo um poder que se traduz em exercício da soberania do país.
Disto, nenhuma das partes parece duvidar, inclusive a Boeing.
União e Embraer buscam, cada qual à sua maneira, convencer que a “Golden Share” não será afetada, seja porque não se está alterando o "controle acionário" da
Embraer, seja porque os "órgãos societários" de governo não vêem como ameaçados os direitos nela contidos, mesmo que não venham alcançar a New Co.
Equivalente a tais justificativas porém, na situação absurda que pode ser imaginada, seria considerar que desde que uma transferência ou "segregação",
no termo que se emprega, seja apenas de uma parte do território brasileiro, a soberania, por preservada na parte remanescente, não seria afetada ou mesmo de
se entender que este aspecto seria de avaliação discricionária do I NCRA ou do I BAMA.
É certo que, constituindo a “Golden Share” patrimônio afeto à União Federal, tem ela a possibilidade de realizar sua desafetação, seja da integralidade
ou de "parte dela" que, evidentemente, não será da ação em si, mas sobre a empresa na qual se encontra.
Subordinar-se-á, entretanto, por corresponder a desafetação a uma renúncia (sobre parte da empresa na qual incide) além de exames técnicos não
limitados a meras "questões societárias", a manifestações de outros órgãos de governo, inclusive do Poder Legislativo por se tratar, em última análise, de
renúncia de direitos da União Federal, enfim, renúncia de patrimônio da nação.
No caso, tem-se que até mesmo a defesa do estado democrático o exigiria, inclusive, a legitimar a atuação do Conselho de Defesa Nacional - CDN, como órgão
consultivo do Excelentíssimo Senhor Presidente da República que não teria, como se busca convencer, ampla discricionariedade em convocá-lo, mas uma efetiva
obrigação diante da presença de interesses militares.
Pelo exposto, incabível afirmar haver uma absoluta discricionariedade do Poder Executivo na "segregação" de parte da Embraer; que a operação não trará
nenhum prejuízo à União ou à Nação pois representa uma alienação de parte do controle da União sobre a "segregada" a ser incorporada na New Co e na qual a
União não deterá a “Golden Share” e, embora não se possa refutar a afirmação de que permanecerá sendo titular daquela ação de classe especial, esta se limitará à
parte remanescente da Embraer, ou seja, da não segregada.
Quanto aos segredos militares não serem transferidos à Boeing, a garantia representada por uma "comissão paritária" que pode ser limitada a apenas
dois membros, um deles indicado pela Boeing e o outro pela Embraer encontra-se distante de representar uma real garantia de preservação de segredos, razão
pela qual, por não especialista neste tema, de todo recomendável a oitiva do órgão legitimado para esta questão que, nos termos constitucionais é o Conselho
de Defesa Nacional, a fim de realizar análise se a "garantia" prevista atende aos interesses da segurança do país.
Sobre a afirmação de que a "operação não afetará negativamente o mercado interno" afora ser extremamente vaga a não permitir precisar seu exato
sentido, constitui, a rigor, mero exercício de futurologia sobre o qual o Juízo reserva-se o direito de não se manifestar.
Sobre o "periculum in mora" inverso, no sentido da "operação" com a Boeing representar uma "tábua de salvação" para a Embraer, considerando o desempenho
das suas ações nos último 10 anos, uma consulta nesta data sobre o valor da ações da Boeing (T he Boeing Company - BA) a revela próxima de USD$ 310,00, em queda
desde outubro do corrente ano. A EMBRAER, por sua vez, após acentuada queda de preço em 2016, apresenta-se com tendência de alta na Nyse. Aliás, faz ela parte
da lista de ativos nível 3 da Nyse, se encontra sujeita a um grau mais elevado de transparência de informações ao mercado.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 21/12/2018
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